sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Uso do carb. heat em helicópteros a pistão equipados com carburador

Artigo elaborado por Marcio Cabrita, instrutor de voo na Go Air

Dos 1.893 helicópteros registrados na frota brasileira da aviação geral em 2012, 627 aeronaves, ou 33% do total, são helicópteros a pistão fabricados pela Robinson Helicopter Company e Schweizer¹. Muitos dos modelos destes fabricantes são utilizados na instrução de voo e sua grande maioria possui carburador no sistema de formação de mistura ar/combustível em seu motor (R22 versões Standard, HP, Alpha, Beta e Beta II; R44 versões Astro e Raven I; e Schweizer 300C e 300CB).

Este artigo tem por objetivo relembrar aos alunos, instrutores de voo e pilotos em geral sobre o uso do sistema de aquecimento do carburador (carb. heat) para se evitar formação de gelo no sistema, de acordo com a recomendação do Pilot’s Operating Handbook (POH) da Robinson para o R22 Beta II.

Descrição

A formação de gelo no carburador ocorre em helicópteros com motor a pistão equipados com sistema de carburador. O ar admitido passa por um duto estreito (tubo de Venturi), o qual recebe o combustível vaporizado. Em função do estado físico do combustível e do declínio de pressão naquele local, particularidade do Venturi, há uma queda acentuada de temperatura, e como há presença de vapor d’água no ar, há grande possibilidade de formação de gelo no sistema do carburador (paredes do Venturi e/ou borboleta) quando atingidas temperaturas abaixo de 0ºC, conforme figura a seguir. Dependendo da quantidade de gelo formado, poderá ocorrer uma obstrução da passagem da mistura ar/combustível, reduzindo potência ou cessando o funcionamento do motor.


Formação de gelo no carburador (Rotorcraft Flying Handbook, 2000).


Há um instrumento específico no painel do helicóptero (carb. temp.), o qual mostra ao piloto qual a temperatura do ar no carburador. Há também um sistema mecânico de aquecimento do ar no carburador que consiste na captação do ar de uma fonte de calor (ex. escapamento), cuja atuação de abrir e fechar a válvula é de responsabilidade do piloto.

 photo carburador3_helicopterogoair_zps8d6ddda4.png
Sistema de carb. heat, instrumento de carb. temp. e switch do carb. heat.

Muitos se enganam ao dizer que o gelo no carburador pode se formar quando se voa em temperaturas baixas. Pois bem, em dias quentes, com temperatura aproximada de 30ºC, pode haver formação de gelo em função da queda brusca de temperatura mencionada anteriormente, podendo ocorrer em qualquer fase do voo (decolagens, subidas, cruzeiro, descidas e aproximações) ou em manobras de emergência (autorrotação).

Helicópteros mais recentes, como no caso da versão Beta II do modelo Robinson R22, há um dispositivo mecânico (Carb Heat Assist System) que correlaciona o comando coletivo e a switch do carb. heat, facilitando assim o trabalho do piloto, não eximindo sua responsabilidade em monitorar o sistema e atuar quando pertinente.

Apresenta-se a seguir as condições que favorecem a formação de gelo no carburador, bem como a forma de identificá-la e como evitá-la, segundo o POH do R22.

Condições mais favoráveis para formação de gelo no carburador:
  • Quando a temperatura externa indicada (Outside Air Temperature – OAT) estiver entre -4ºC e 30ºC;
  • Diferença entre OAT e ponto de orvalho for menor que 15ºC;
  • Sobrevoando ambientes úmidos (lago, rio, mar);
  • Voar com o carb. temp. dentro do arco amarelo (-15ºC a 5ºC).

Como identificar:
  • Decréscimo da rotação do motor é a primeira indicação, tomando-se cuidado pois o governador atuará para manter a RPM na faixa de 101% a 104%²;
  • Aspereza do motor;
  • Decréscimo da pressão de admissão (PA).

Como evitar:
  • Nos testes de motor durante a fase de acionamento (run-up):
    • Utilizar full carb. heat durante aquecimento do motor para pré-aquecer o sistema de indução.
  • Durante decolagem, subida e cruzeiro:
    • Utilizar carb. heat, como preferir, para manter o indicador de carb. temp fora do arco amarelo.
  • Durante descidas e autorrotações:
    • Utilizar full carb. heat quando potência abaixo de 18 in. Hg de PA, ignorando sempre o indicador de carb. temp.;
  • Em todas as fases do voo:
    • Para a versão Beta II, equipada com Carb. Heat Assist System, a switch deve permanecer destravada;
    • Quando em dúvida, assuma condições de formação de gelo no carburador e aplique carb. heat como preferir.

Conclusão

Uma vez que a utilização do carb. heat reduz a potência do motor para determinada PA, há necessidade de 1,5 in. HG adicional de PA para gerar potência máxima contínua (Maximum Continuous Power – MCP) ou potência de decolagem (Takeoff Power – TOP) com full carb. heat aplicado³, cabendo ao comandante do helicóptero a melhor avaliação para aplicar carb heat em seu voo.


Gelo formado no carburador (http://www.challengers101.com/CarbIce.html).

Operação em ar quente e úmido, ar frio e seco, helicóptero com passageiro e combustível nos limites, decolando de área restrita, enfim, todas as condições devem ser avaliadas preliminarmente para se evitar a formação de gelo no carburador.

Curiosidade


Formação de gelo em motor não aeronáutico.

¹Terceiro Anuário Brasileiro de Aviação Geral publicado pela Associação Brasileira de Aviação Geral – ABAG, agosto de 2013.
²Safety Note nº 31 de dez/1996 (Robinson).
³Safety Note nº 25 revisado em jul/2012 (Robinson).

Referências

Helicopter Flying Handbook. U.S. Department Of Transportation. FAA-H-8083-21A, 2012.

Rotorcraft Flying Handbook. U.S. Department Of Transportation. FAA-H-8083-21, 2000.

R22 Pilot’s Operating Handbook. Robinson Helicopter Company. Fevereiro, 2013.

Terceiro Anuário Brasileiro de Aviação Geral publicado pela Associação Brasileira de Aviação Geral – ABAG. Agosto de 2013.

Um comentário:

  1. Esse assunto pode ser fundamental...parabéns pela publicação e lembrar aos colegas da aviação, o valor à vida.
    Abraço
    Roque.

    ResponderExcluir